Egresso da UFPR é primeiro brasileiro a receber Prêmio Francês de Direito Comparado

O egresso do curso de Direito da Universidade Federal do Paraná, Thales Morais da Costa, recebeu o Prêmio 2018 do Centre Français de Droit Comparé. O resultado foi divulgado no mês de março e, pela primeira vez, um brasileiro é contemplado.

Filho dos professores aposentados do curso de Letras da UFPR, Edison José da Costa e Marta Morais da Costa, o pesquisador enfatiza que, mais do que uma vitória pessoal, o fato de um brasileiro obter o prêmio serve como termômetro da melhoria do ensino jurídico no Brasil. “Ainda há muito o que aprimorar, mas alguém formado em direito na UFPR tem condições de cursar pós-graduação no exterior, especializar-se em determinada área e desenvolver trabalhos suscetíveis de concorrer de igual pra igual com os pesquisadores de outro país, inclusive quando estes trabalham em sua língua materna, como é o caso dos doutores de nacionalidade francesa”, avalia.

A premiação refere-se à defesa da tese de doutorado de Costa – primeira a envolver exclusivamente o Brasil e a Colômbia. “Os prêmios anteriores foram, em sua maioria, outorgados para teses envolvendo países ditos desenvolvidos e alguns países do Oriente Médio. Ou seja, países com os quais a França mantinha relações culturais, políticas e econômicas bilaterais”, esclarece Thales. “O fato de uma pesquisa sobre países sul-americanos ter recebido esse reconhecimento evidencia que esses países são, como todos os demais, objetos dignos de investigação científica, inclusive para um público exclusivamente francófono”.

O prêmio, para Costa, é consequência de esforço e renúncia. “Assumi o desafio de fazer uma tese sobre países pouco conhecidos na França, o que me obrigou a desenvolver um método e uma linguagem próprios. Tive que defender a legitimidade dessas escolhas em uma língua que não era a minha. Não foi fácil lidar com a insegurança de trilhar caminhos inexplorados. O fato de ter recebido a nota máxima da banca e, agora, o prêmio do Centre Français de Droit Comparé revela que estive à altura dos múltiplos e sucessivos desafios”, afirma o pesquisador

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Thales Morais da Costa recebendo o diploma de doutorado na França. Foto: arquivo pessoal.

Trajetória

O interesse pela pesquisa manifestou-se no início da vida universitária em 1996. “Ingressei no Programa Especial de Treinamento (PET) de Direito no segundo ano do curso e lá fiquei até o final da graduação”, conta Thales, que trabalhou em escritórios de advocacia de Curitiba até ter a oportunidade de cursar o mestrado na França. “Fiz mestrado em Direito Público na Université Paris 1 Panthéon-Sorbonne (Sorbonne), entre 2003 e 2004, o diploma foi reconhecido pela UFPR em 2012”.

Durante a trajetória acadêmica, o pesquisador cursou pós-graduação em Direito e Globalização Econômica, promovido conjuntamente pela Sorbonne, pela SciencesPo e pela Columbia University, e doutorado na Sorbonne, em regime de dupla titulação com a USP, sendo bolsista do governo francês por três anos. Na mesma época, Costa teve a oportunidade de lecionar na grade curricular normal da Sorbonne. “Foram quatro matérias lecionadas: liberdades públicas, direito constitucional, contencioso administrativo e direito comunitário econômico”, afirma.

O pesquisador retornou recentemente para Curitiba e atua em um escritório de advocacia. Atualmente, Thales avalia a possibilidade de conjugar atividades de ensino e busca oportunidade de publicação da tese.

Motivação

A comparação entre o direito francês e o brasileiro tornou-se uma necessidade para Thales. “Logo apareceram grandes lacunas na bibliografia até então existente, seja em língua portuguesa, seja em língua francesa. Havia, de fato, amplas áreas do direito para as quais havia pouco ou nenhum material propondo uma análise comparativa entre Brasil e França”, diz.

Com o objetivo de modificar tal quadro, Costa iniciou um projeto, ao lado de colegas do doutorado, de comparação jurídica que se traduziu, no espaço de dez anos, em cinco colóquios internacionais e três livros publicados, um deles disponível em português e em francês. “Essa experiência me habilitou a encarar o desafio de fazer uma tese envolvendo Brasil e um direito até então desconhecido para mim, que era o da Colômbia; e ainda trazer essa análise para o público francês, o que supunha comparar as normas dos três países. Foi isso que me trouxe até aqui”.

Tese premiada

Confira abaixo o relato de Thales sobre a temática da tese premiada “Les actions collectives em droit brésilien et em droit colombien”

“A maneira mais acessível de apresentar minha tese é através de um exemplo. Imagine-se um desastre ambiental com grande número de vítimas. Antes da emergência das ações coletivas, a reação do Estado consistia basicamente em sanções administrativas suscetíveis de serem aplicadas ao causador dos danos. Sua real aplicação dependia, porém, da decisão da autoridade administrativa, sujeita a diversas formas de pressão política. Ao juiz, cabia a tarefa de indenizar as vítimas, mas apenas de forma individualizada. Ele não tinha a possibilidade de condenar o responsável a reparar os danos coletivos.

A criação das ações coletivas na segunda metade do século XX deu ao judiciário novos meios de reagir a situações como essa, ampliando de modo considerável seu papel na gestão de assuntos de interesse público. Todos concordam quanto à importância dessa inovação, mas a maneira como ela é tradicionalmente vista precisa ser repensada. Para os professores de direito, as ações coletivas são processos judiciais em defesa de um novo tipo de direito ou interesse, dito de natureza coletiva. São tidas como algo característico da tradição anglo-saxã, a common law, e que teriam sido importadas por países de tradição romanista ou civil law, como é o caso do Brasil e da Colômbia.

A tese demonstra que a especificidade dessas ações reside não no tipo de direito ou interesse protegido, mas no fato de permitirem ao juiz substituir-se à autoridade administrativa na prescrição de comportamentos a fim de prevenir, cessar ou reparar danos a um número indeterminado de pessoas. É por essa razão que, em países com forte tradição administrativa – como é o caso da França até hoje em dia e, em certa medida, como foi o caso do Brasil e da Colômbia até metade do século XX – ações dessa natureza são bastante raras. Decorre dessa constatação que a compreensão das ações coletivas passa por sua inserção na evolução do contencioso administrativo e não na dicotomia common law / civil law”.

Prêmio

A premiação é outorgada anualmente desde 1957. A lista dos agraciados está disponível na página do Centre Français de Droit Comparé. Os contemplados são, em sua maioria, pesquisadores franceses, mas há também doutores originários de países geograficamente próximos à França.

 

FONTE: https://www.ufpr.br/portalufpr/noticias/egresso-da-ufpr

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